Ir até um asteroide, colher amostras e retornar à Terra. A missão da sonda japonesa Hayabusa2 é fácil de descrever, mas dificílima de executar. A espaçonave partiu às 2h22 desta quarta-feira (pelo horário de Brasília), do Centro de Lançamento de Tanegashima, impulsionada por um foguete H-IIA. O retorno está marcado para 2020, e certamente teremos muitas emoções até lá, a julgar pela saga de sua antecessora.
A Hayabusa original (“falcão peregrino” em japonês) partiu em 2003 e, em 2010, tornou-se a primeira sonda a trazer amostras prístinas de um asteroide. Mas foi um drama. A espaçonave equipada com motores iônicos teve dificuldades para voltar à Terra, e existia um risco de que ela retornasse de mãos vazias, uma vez que não havia certeza, pela telemetria, de que ela de fato tivesse conseguido colher uma amostra. Mas tudo está bem quando termina bem, e a missão acabou se tornando um símbolo da tenacidade dos engenheiros japoneses, que não são brasileiros, mas também não desistem nunca.
De sua sucessora, a Hayabusa2, não podemos esperar menos. Partindo hoje, ela passará perto da Terra novamente em 2015 e usará a gravidade do planeta para colocá-la a caminho do asteroide 1999 JU3 (que provavelmente ganhará um nome mais palatável em breve, por conta da missão). A sonda entrará em órbita desse bólido celeste em 2018 e terá um ano para mapeá-lo, fazer o pouso e colher as amostras.
ORIGEM DA VIDA
Diferentemente do asteroide Itokawa, de tipo S (silicato), visitado pela primeira Hayabusa, o 1999 JU3 é do tipo C, carbonáceo. E os japoneses querem colher uma amostra do interior do objeto, que não tenha sido desgastada por bilhões de anos de interação com a radiação solar. Para isso, dispararão um pequeno projétil a fim de abrir uma minicratera, de onde a sonda em seguida tentará retirar sua amostra. A ideia é com isso ter uma boa noção dos potenciais compostos orgânicos presentes durante a formação do Sistema Solar. De certa forma, a missão fará um retrato de nossos ancestrais não-biológicos — a matéria-prima que, na Terra, daria origem à vida.
Também será uma boa oportunidade para medir a quantidade de água presente no interior da rocha. Especula-se que objetos como o 1999 JU3 tenham fornecido boa parte da água do nosso planeta durante sua formação (lembre-se, asteroides são o que restou dos materiais que constituíram os planetas, 4,6 bilhões de anos atrás).
Fora essa novidade do projétil para a minicratera, a Hayabusa2 é muito similar à primeira. E voa acompanhada: nada menos que três pequenos satélites foram lançados em conjunto com ela. O Shin-en 2 é um projeto universitário transportando um radiotransmissor. O ARTSAT é uma escultura feita numa impressora 3D com um computador dentro, que irá gerar e transmitir poemas para a Terra. E o PROCYON passará pela Terra de novo em 2015 e será enviado a um asteroide próximo (ainda a definir) para um sobrevoo.
Não está bom? Então tem mais. A Hayabusa2 leva dois pequenos módulos de pouso autônomos, o japonês Minerva-II e o europeu Mascot. Ambos tentarão descer e operar na superfície do 1999 JU3 — o que não vai ser fácil. O Minerva que acompanhava a Hayabusa original não conseguiu descer no Itokawa.
Os japoneses, por algum motivo, costumam ter missões espaciais atribuladas. Tanto sua sonda marciana como a venusiana fracassaram na hora de entrar em órbita de seus respectivos alvos. Mas a Hayabusa foi um sucesso retumbante, e a segunda espaçonave a carregar o nome quer seguir nessa tradição. O Mensageiro Sideral deseja toda sorte do mundo em mais essa árdua jornada.
Aproveite o embalo e também fique ligado nos americanos, que lançam na quinta-feira pela primeira vez sua cápsula Órion, espaçonave destinada a levar astronautas além da órbita terrestre. Esse primeiro voo de teste será sem tripulação. Mas é um começo.
POR SALVADOR NOGUEIRA