escritor poeta, radialista,

terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Veloz, furioso e com uma lua

POR SALVADOR NOGUEIRA

Lembra aquele asteroide que ia passar de raspão pela Terra? Pois é, ele passou ontem e se manteve a uma distância segura do nosso planeta, como já era esperado. O que não se esperava foi a descoberta feita durante a passagem: o asteroide tem sua própria lua!
Imagem de radar revela forma do asteroide 2004 BL86 e sua lua (Crédito: Nasa)
Imagem de radar revela forma do asteroide 2004 BL86 e sua lua (Crédito: Nasa)
O bólido celeste, conhecido pelo pouco atraente código 2004 BL86, revelou suas formas com detalhes surpreendentes após observações de radar feitas pela Nasa com sua antena de 70 metros instalada em Goldstone, na Califórnia. Graças a ela, foi possível estimar com razoável precisão o tamanho do objeto (325 metros, contra 500 da estimativa inicial) e descobrir uma lua de cerca de 70 metros orbitando ao redor dele. Não é incrível?
Além disso, foi possível estudar outros parâmetros interessantes, como sua rotação, seu formato e algumas características mais grosseiras de sua superfície. Tudo isso a uma distância de 1,2 milhão de quilômetros, cerca de três vezes a separação entre a Terra e a Lua. A aproximação máxima entre o pedregulho e nosso planeta aconteceu ontem às 14h19 (horário de Brasília). Quem soube para onde olhar e tinha um binóculo na madrugada de hoje pôde até observá-lo (mas, mesmo para esses mais antenados, ele não passou de um simples ponto de luz, claro).
Caso tivesse colidido com a Terra, o 2004 BL86 poderia ter causado uma grande tragédia. Para que se tenha uma ideia, ele é cerca de 15 vezes maior que o bólido que caiu sobre Chelyabinsk, na Rússia, em 2013, ferindo cerca de 1.500 pessoas.
BINÁRIO
Embora os cientistas não esperassem encontrar uma lua em torno do 2004 BL86, não se trata de uma ocorrência inédita. Na verdade, estima-se que cerca de 16% dos asteroides com mais de 200 metros sejam binários, ou seja, compostos por dois corpos distintos. Em alguns casos, já foram observados até sistemas trinários.

As observações feitas por radar atingiram uma resolução de quatro metros por pixel, o que chega a impressionar, considerando a distância de 1,2 milhão de km. Se passasse mais perto, poderíamos ter aprendido ainda mais. Não sei quanto a vocês, mas o Mensageiro Sideral, nesses casos, fica bem mais satisfeito com uma olhada meio de longe mesmo.
O perigo dos asteroides é inegável. É um daqueles famosos eventos de “probabilidade baixíssima, mas enormes consequências”. Algo como ganhar na Mega-Sena. Só que ao contrário. Com o agravante de que, no caso em questão, não podemos simplesmente optar por não jogar.
Felizmente, temos em nosso favor a inteligência. A cada “quase” desses, aprendemos mais sobre a natureza, a composição e a estrutura desses objetos. E, claro, temos diversas espaçonaves não-tripuladas que têm encontros marcados com bólidos similares, a fim de estudá-los. A Nasa está planejando a missão OSIRIS-REx, com lançamento marcado para 2016, cujo objetivo é visitar um asteroide e trazer amostras dele. Procedimento similar já foi feito pela incrível missão japonesa Hayabusa, que em 2010 trouxe de volta à Terra preciosas amostras do asteroide Itokawa. E sua sucessora, a Hayabusa2, já está no espaço, para repetir a dose e retornar ao seu planeta de origem em 2020.
Com o contínuo desenvolvimento das tecnologias espaciais, não parece haver nada impossível no futuro desenvolvimento de um sistema de proteção planetário. A engrenagem básica, na verdade, já está em funcionamento — é o esforço preventivo de identificar e monitorar esses objetos, conforme avançam em suas órbitas em torno do Sol. Por exemplo: já sabemos que temos um próximo “encontro” marcado para daqui a 12 anos. Em 7 de agosto de 2027, o asteroide 1999 AN10, de porte similar, passará a meros 390 mil km da Terra — praticamente a mesma distância que guardamos da Lua. Esperemos que, a exemplo do 2004 BL86, ele só traga boas surpresas.

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